Os preços dos alimentos continuam atingindo níveis históricos. Será que essa tendência vai durar muito tempo?
No Brasil, quem gosta de café passou a usar mais o pó para preparar bebidas à base de café. Nos Estados Unidos, alguns restaurantes começaram a cobrar taxas extras em pratos que levam ovos.
Nos últimos dois anos, os preços de alimentos como azeite de oliva, suco de laranja e cacau subiram bastante em várias partes do mundo.
Depois da invasão da Ucrânia pela Rússia em 2022, os preços dos alimentos atingiram recordes históricos. Mesmo que tenham dado uma leve caída desde então, continuam muito altos, os mais elevados das últimas seis décadas.
Especialistas dizem que esses fatores que causaram essa alta parecem indicar uma mudança definitiva. O pesquisador Rob Vos, do Instituto Internacional de Pesquisas sobre Políticas Alimentares (IFPRI), explica: "A era da comida barata acabou." Segundo ele, o mundo precisa aprender a lidar com essa nova realidade.
Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).
O especialista em demografia e economia José Eustáquio Diniz é ex-professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE. Ele afirma que, em termos reais, esta década viu os preços médios dos alimentos mais altos dos últimos 100 anos.
O professor considera esta tendência como um risco "sério" para a segurança alimentar global.
A última vez em que os preços dos alimentos atingiram níveis recorde ocorreu em 1974 e 1975, após a crise do petróleo de 1973. Na época, os custos aumentaram em inúmeros setores, incluindo a produção e o transporte de alimentos.
A guerra e os fertilizantes
O conflito na Ucrânia afetou bastante os mercados globais de alimentos. Isso aconteceu principalmente porque a Rússia e a Ucrânia são grandes exportadores de trigo e óleo de girassol, e a Ucrânia também é uma das principais fornecedoras de milho.
No começo de 2022, os preços desses produtos subiram bastante, quando a Rússia bloqueou os portos ucranianos. Mas, com um acordo entre os dois países e a criação de novas rotas de embarque, a Ucrânia conseguiu retomar suas exportações.
Segundo Monika Tothova, economista da FAO, o impacto não foi tão sério quanto alguns imaginavam. No entanto, o conflito trouxe à tona uma preocupação que também afeta os agricultores: o preço dos fertilizantes.
O gás natural é essencial para produzir fertilizantes. Antes mesmo da guerra, seu preço já estava alto, mas em 2022 esse valor disparou ainda mais, porque o conflito elevou os preços do gás, o que aumentou os custos de produção de alimentos.
Produção, alimentação e demanda
Além disso, há fatores mais duradouros em jogo.
De acordo com Vos, "a era dos preços baixos dos alimentos foi consequência de um grande avanço na produtividade agrícola desde os anos 1970". Esse período ficou marcado pela Revolução Verde, que trouxe variedades de plantas mais produtivas e técnicas agrícolas mais intensivas.
Porém, esse crescimento na produtividade começou a desacelerar. Com uma demanda maior por alimentos, os preços médios começaram a subir, explica o pesquisador.
Essa demanda vem crescendo especialmente nos países em desenvolvimento, onde as populações estão aumentando e os hábitos alimentares estão mudando.
Diniz comenta que "as pessoas estão consumindo mais carne, laticínios, frutas, legumes e verduras". Mas a produção nesses setores não acompanhou esse aumento no consumo, o que deixou os alimentos mais caros.
Desde 2022, os preços globais dos alimentos vêm caindo. Mas isso não significa que os preços no varejo tenham baixado em todos os lugares.
Segundo Dawit Mekonnen, economista do Grupo de Perspectivas do Banco Mundial, em muitos países os preços continuam bem mais altos do que há quatro anos. Isso prejudicou bastante o acesso às refeições adequadas.
A desnutrição também aumentou ao redor do mundo. Ela atingiu seu menor nível em 2017, com 7,1% da população mundial passando fome. Agora, voltou para 9,1%, conforme dados da FAO.
Mais de um terço da população mundial não consegue pagar por uma alimentação saudável — entre eles, cerca de dois terços da população da África, segundo a avaliação mais recente da organização.
Alguns economistas acreditam que os preços dos alimentos podem diminuir um pouco nos próximos 12 meses. Mas a maioria espera que continue havendo muita volatilidade.
Rob Vos alerta que "as causas dos aumentos nos preços — como custos elevados de produção, problemas nas cadeias de abastecimento, mudanças climáticas e políticas comerciais — ainda estão presentes e não desaparecem".